A Apple Inc. e a Samsung Electronics Co. devem deixar bem claro que a indústria de celulares inteligentes está cada vez mais dividida entre quem pode e quem se sacode.
A Apple divulgou ontem um lucro para os primeiros três meses do ano, e a Samsung também deve ficar no azul no balanço que divulgará na semana que vem. Em grande parte, isso se deve às vendas de smartphones. Juntas, elas venderam quase metade de todos os smartphones, despachando concorrentes como a Nokia Corp., a HTC Corp. e a Research In Motion Ltd.
Ainda assim, a Apple e a Samsung chegaram ao topo usando cartilhas bem diferentes.
A Apple, empresa mais valiosa do mundo, vende só um celular, o iPhone. A empresa de Cupertino, na Califórnia, prioriza design e lucratividade contra faturamento. Ela também investe pesado em sua marca e em suas lojas controladas à rédea curta, e se beneficia de um forte ecossistema de softwares e apps.
Por sua vez, a Samsung, a empresa de tecnologia que mais faturou no mundo todo ano passado, vai de escala. A companhia sul-coreana capta tendências com rapidez e diversifica suas apostas, criando várias versões de diversos produtos para atender às necessidades de parceiros. Ela aumenta os lucros controlando sua própria manufatura.
A divergência de caminhos é prova de que modelos diferentes podem prevalecer. Tanto a Apple quanto a Samsung estão perto de ter 25% do mercado mundial de smartphones, segundo a firma de pesquisas IDC, que estima que esse segmento atingirá US$ 219 bilhões em vendas este ano.
As duas empresas foram as únicas grandes fabricantes de smartphones a ganhar mercado no quarto trimestre. A fatia da Apple passou de 16% no fim de 2010 para 23,5%. A da Samsung foi de 9,4% para 22,8% no mesmo período.
Além disso, a Apple e a Samsung juntas obtiveram 91% dos lucros operacionais de todas as fabricantes de celulares no quarto trimestre, comparado com 61% ano passado, segundo a Strategy Analytics, uma firma de pesquisa de mercado sediada em Londres.
“A esta altura, realmente parece que essas duas estão se distanciando”, disse Manish Nigam, analista de tecnologia do Credit Suisse em Hong Kong.
A batalha por supremacia tem causado colisões entre a Apple e a Samsung. Em abril de 2011, a Apple processou a Samsung acerca de designs e patentes. A Samsung processou de volta e a batalha jurídica se espalhou para nove países.
Recentemente, a Samsung partiu para cima da Apple em seu marketing do celular Galaxy, com comerciais que tiram sarro dos fãs da Apple.
Mas as companhias também aprenderam a trabalhar uma com a outra. A Apple é a maior cliente das divisões de componentes da Samsung, que fazem telas e chips. E sua batalha jurídica não afetou o desempenho de nenhuma das duas.
Apple e Samsung não quiseram comentar.
Apesar da predominância delas, “não vai ser sempre uma corrida de dois cavalos”, disse Rajeev Chand, diretor de pesquisa para o banco de investimentos Rutberg & Co. Ele observa que atores menores como a fabricante de equipamentos de telecomunicações Huawei Technologies Co. estão crescendo, embora em menor escala.
De fato, a indústria de celulares tem se caracterizado por ciclos rápidos de produtos, em que um só ciclo perdido pode prejudicar. “Essa indústria se move em ciclos onde algumas empresas dominam por um tempo e então caem”, disse Neil Mawston, diretor executivo da Strategy Analytics. “Nos anos 80, era a Motorola, depois a Ericsson e em 2000 foi a vez da Nokia. Agora, são a Apple e a Samsung.”
O setor está tentando se proteger contra o crescente predomínio das duas. A telefônica americana Verizon Communications Inc., cujos investidores estão incomodados com o custo de oferecer o iPhone, anunciou na semana passada que também iria oferecer celulares que rodam o software Windows, da Microsoft Corp. Nos Estados Unidos, as operadoras pagam cerca de US$ 400 para subsidiar o custo de um iPhone, estimam analistas.
“É importante que haja um terceiro ecossistema que seja incluído na mistura aqui, e nós damos total apoio ao da Microsoft”, disse o diretor financeiro da Verizon, Francis Shammo, na semana passada.
A AT&T Inc., por motivos similares, botou bastante peso no Lumia 900, da Nokia, que também roda o Windows. A Nokia afirmou na semana passada que as vendas nos EUA foram boas, mas em geral foram “mistas” e que iria rebaixar “profundamente” os preços do Lumia.
A Verizon e a AT&T não quiseram comentar ou não responderam a pedidos de mais comentários.
O ímpeto da Samsung é particularmente notável. Analistas esperam que a companhia, que depende bastante de telefones que rodam o programa Android, da Google Inc., dobre o volume de vendas de seus smartphones este ano. No ano passado, a Samsung vendeu 94 milhões deles, segundo a IDC, e a Apple, 93,2 milhões.
A Samsung já conseguiu superar a ex-líder do mercado, a Nokia, ao adotar vários sistemas operacionais e, quando o Android começou a se destacar, colocou mais recursos em produtos que usam esse software. A Samsung usou estratégia parecida quando outros eletrônicos, como televisores e aparelhos de DVD, passaram por transições tecnológicas.
A Samsung também se beneficiou do desejo de revendedores de oferecer alternativas ao iPhone, dando-lhes mais produtos em várias categorias de preço para trabalhar. Como a Apple, a Samsung tem escala que permite pagar menos que os concorrentes por componentes.
A Samsung criou cinco níveis de celulares baseados no Android que se distinguem por preço e funções, com dois ou três modelos em cada nível para ajudar as operadoras e outros distribuidores a se distinguir uns dos outros. A companhia também está fazendo telefones baseados no programa Windows Mobile, da Microsoft, e em seu próprio sistema operacional, o Bada.
Na semana que vem, a Samsung deve revelar uma nova versão de seu carro-chefe, o smartphone Galaxy, com um evento em Londres que tem gerado zunzunzum entre fãs do setor.
Espera-se que a Samsung, que divulga resultados na sexta-feira, mostre uma alta de 80% no lucro, para cerca de US$ 4,4 bilhões, graças em grande parte a celulares, mas também à força no segmento de chips e a um retorno de seus negócios de TV, que lidera o setor.
A Apple divulgou ontem um salto de 94% no lucro, para US$ 11,62 bilhões.
A Apple, que mantém alguns dos modelos mais antigos do iPhone no mercado, vendeu 37 milhões de iPhones nos últimos três meses do ano passado, mais do que o dobro de um ano antes. Mas a estratégia de um só produto da Apple deve ser testada conforme smartphones se tornam mais comuns, particularmente em mercados menos afluentes como Índia e China.
“A Apple está chegando a uma bifurcação na estrada em que terá de decidir se continua sendo um participante de preço alto ou se entra no meio-termo do mercado de massa”, disse Mawston.