Ivan Pinto produz uvas em Curaçá, norte da Bahia. Toda semana, antes de liberar uma carga de sua mercadoria, ele precisa percorrer quase 92 km para chegar até Juazeiro e poder acessar uma internet arcaica, e assim emitir nota fiscal eletrônica, Certificado Fitossanitário de Origem (CFO) e Permissão de Trânsito Vegetal (PTV), documentos necessários a cada venda efetuada.
Ele perde em torno de 2 horas só em trânsito entre as duas cidades. “Isso quando dá para fazer tudo de vez. Às vezes tem que ficar indo e vindo”, ressalta o agricultor. Ele também tem que percorrer o mesmo caminho sempre que precisa acessar informações climáticas para regular a irrigação de sua plantação, mandar relatórios para clientes ou rastrear seus produtos.
“Minha produção é escoada para São Paulo, mas se fosse exportar ia ser pior, porque são mais documentos ainda”, reclama ele, que para viabilizar o escoamento foi obrigado a montar um escritório em Juazeiro. “Lá, a internet não é o ideal. Você paga 5 MB, mas só chega 1 MB. É lenta, mas pelo menos eu consigo trabalhar”.
“Um caminhão parado por um dia custa R$ 1.500 ao produtor”, acrescenta o diretor da Associação Brasileira de Agricultores e Irrigantes da Bahia, Alex Rasia.
Há 600 metros dali, em Petrolina (PE), Danilo Bione produz mangas e não tem do que reclamar. Na zona rural da cidade tem internet banda larga desde 2010, graças ao programa Roça Digital, elaborado pelo governo de Pernambuco e financiado pelo governo federal. Custou R$ 4 milhões e oferece internet banda larga aos núcleos irrigados de Petrolina e polos vinícolas (produtores de uva).
“Em, no máximo, cinco minutos resolvo tudo. E se o cliente já estiver cadastrado é mais rápido ainda”, elogia o produtor, que lembra sem saudade dos tempos em que não tinha internet na roça. “Quando não tinha, a gente tinha que ir até a cidade (zona urbana) para fazer essas coisas. Aí tinha que se programar para fazer tudo de uma vez, pra não perder tanto tempo”.
Na Bahia, o governo também tem um projeto para instalar banda larga no interior do estado. O projeto baiano vai sair 100x mais caro que o pernambucano: R$ 407 milhões. Isso porque, segundo a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, o estado vai investir em uma rede própria, enquanto a utilizada em Pernambuco é alugada. Além disso, a área de abrangência é bem maior.
“Não existe rede própria em Petrolina. O que existe é um convênio com a Oi por quatro anos, o que é um problema, porque fica subordinado à Oi”, critica o secretário Paulo Câmera. Ele prevê que, após os 4 anos, Pernambuco não terá rede e terá que realizar nova licitação de serviços.
Câmera explica que, no caso da Bahia, o projeto será executado em duas etapas. A primeira iniciará em 2013 e compreenderá 156 municípios. “Serão gastos R$ 116 milhões, que já estão sendo captados no governo federal”, explica.
O projeto da rede também contempla o lançamento de fibras ópticas, prioritariamente aéreas, a aquisição e a instalação de equipamentos rádios, ópticos e de dados. Segundo o secretário, a primeira etapa não precisará estar totalmente concluída para começar a funcionar. “A ideia é fazer por fases. Termina um pedaço e bota para funcionar, depois faz outro pedaço e libera também. Para acelerar, vamos usar os cabos da Chesf. A ideia é terminar em um ano”, prevê.
A outra etapa, no entanto, ainda não tem data para começar e nem dinheiro garantido. “Assim que terminarmos essa primeira etapa, vamos tratar de buscar dinheiro para fazer a segunda”, diz o secretário. Ele garante que a zona rural também será beneficiada por causa dos ‘pops’, que são antenas retransmissoras do sinal digital. Serão 23 pops nesta primeira etapa.
O apagão tecnológico e os entraves que ele causa no agronegócio foi tema do Agenda Bahia de terça-feira. Na ocasião, produtores, empresários e representantes do governo discutiram soluções para a falta de uma rede moderna de telecomunicações.
Entre essas soluções, foi apontado um possível acordo entre os governos baiano e pernambucano para usar o sistema já implantado em Petrolina também em Juazeiro. “Em vez de puxar 600 quilômetros de fibra para lá, é só puxar 600 metros a fiação do outro lado do rio”, sugeriu Ivan Pinto. Isso porque, apesar de ficarem em estados diferentes, Juazeiro e Petrolina são separadas apenas por uma ponte de 600 metros, sobre o rio São Francisco.
Sobre o assunto, o professor e coordenador de redes da Unifacs Luciano Pena opina: “É possível, mas devem ser estudadas as condições, porque as tributações dos dois estados podem ser diferenciadas”. Porém, Pena lembra que essa parceria resolveria o problema apenas naquela região e que a política do governo da Bahia contempla o estado inteiro.
“Atuar em retalhos também não resolverá o problema do estado como um todo. E quem leva informação e tecnologia leva desenvolvimento”. E ele finaliza: “É preciso buscar também parcerias na iniciativa privada, em apoio ao governos estadual e federal. Porque se esse programa de expansão da banda larga depender apenas do governo federal ele vai ficar só no papel, ou irá demorar de sair”.
Os problemas com a internet não estão restritos apenas a municípios distantes da capital. Em Alagoinhas, a 116 km de Salvador, o dono de uma indústria de laticínios, Paulo Cintra, passa por um problema bem parecido. “Já perdi muita venda porque não consegui emitir a nota fiscal”, reclama.
De acordo com Cintra, o sistema de internet na cidade é tão arcaico que ele precisou contratar os serviços de quatro operadoras: “Tenho TIM, GVT, Vivo e Oi Velox. Um funciona de manhã e outro cai à noite. Só assim para estar sempre conectado”, relata o empresário, que gasta R$ 6 mil mensais só com internet.
“O impacto para o agronegócio é muito negativo. O governo estabelece obrigações e ele mesmo não nos dá condições de cumpri-las”, diz, se referindo às notas e certificados que devem ser emitidos digitalmente. A fábrica de Cintra produz cerca de 900 mil toneladas de iogurte por mês e abastece os mercados da Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco.
A Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) realiza hoje o encontro Cenário de TI na Bahia: Perspectivas e Oportunidades. Tendo como pano de fundo o Polo de Informática de Ilhéus, que vê sua competitividade ser afetada desde 2008, os participantes vão apresentar as novidades em tecnologia da informação no país, além de traçar cenários e apresentar oportunidades para o setor na Bahia.
Especialistas do Ministério de Ciência e Tecnologia, do BNDES e da Finep vão apresentar e debater, com empresários baianos, o que há de mais atual em projetos de TI no país, e iniciativas promissoras. Atualmente o Polo tem enfrentado problemas relacionados à sua infraestrutura logística deficiente, restrições na área de comunicações, apagões na energia e a escassez de linhas de financiamento.