Depois de ter dedicado décadas à conquista do setor de telecomunicações da América Latina, Carlos Slim pode agora estar se preparando para uma batalha com os reguladores da região.
As ações da América Móvil (telefônica internacional do bilionário mexicano) passaram por momentos difíceis recentemente. Vários governos latino-americanos vêm ampliando seus esforços para incentivar a concorrência nos mercados onde a empresa atualmente domina.
No Brasil, onde a América Móvil é dona da Claro, Embratel e Net (e afirma ter 25% do mercado de telefonia celular), um plano aprovado em novembro reduz as tarifas que as operadoras podem cobrar umas das outras para chamadas feitas para seus clientes. Na Colômbia, onde a América Móvil tem 63% do mercado de telefonia celular, o Congresso apresentou um projeto de lei para limitar a participação de mercado de operadoras em um máximo de 30%. Na Argentina, o governo está planejando uma rede celular estatal, usando 25% do espectro disponível.
Ao mesmo tempo, no México, onde a América Móvil controla 69% do mercado de telefonia celular, mais de 75% do mercado de telefonia fixa e 63% do mercado de internet de banda larga, de acordo com o HSBC, o presidente recém-eleito ameaça tentar reduzir essa hegemonia. Em seu discurso inaugural em dezembro, o presidente Enrique Peña Nieto incluiu o aumento da concorrência no setor de telecomunicações nos 13 itens de sua agenda de prioridades. Entre as medidas possíveis estão regras que favorecem empresas de menor porte em áreas como tarifas de interconexão e agrupamento de serviços.
A América Móvil tem menosprezado o risco de que tais regras, conhecidas como normas assimétricas, sejam colocadas em prática, dizendo que elas vêm sendo consideradas por anos, mas nunca entraram em vigor porque levam, na prática, os clientes da operadora dominante a subsidiar a ineficiência de concorrentes menores.
Mas as ações da empresa sugerem que ela está preocupada. No início de dezembro, o diretor financeiro da América Móvil, Carlos García Moreno Elizondo, organizou uma teleconferência para refutar um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Nele, a OCDE diz que o investimento per capita no setor de telecomunicações é menor no México do que em qualquer outro país que integra a organização, enquanto os preços são os mais altos. A OECD culpa os preços das telecomunicações por uma perda anual no “padrão de vida do consumidor” equivalente a 1,8% do produto interno bruto, em média, entre 2005 e 2009. O relatório, encomendado pelo regulador mexicano das telecomunicações, recomenda a adoção de normas assimétricas.
Analistas acreditam que a estratégia de defesa da América Móvil talvez consiga enfraquecer a força do relatório. Mas as recentes ameaças de novas regras podem ter abalado a confiança dos investidores: as ações mexicanas da empresa perderam 10% do valor desde que o plano brasileiro foi aprovado, no dia 5 de novembro. O Brasil representou quase 26% da receita da empresa em 2011.
Ainda assim, as ações da América Móvil não parecem tão caras. Os papéis estão sendo negociados no México a 5,8 vezes o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização, em comparação com 5,4 vezes para a operadora espanhola Telefónica|Vivo. E a América Móvil é mais lucrativa: as suas margens de Lajida foram de 37,4% em 2011, contra 30% da Telefónica. Além disso, ao contrário da rival, ela não tem uma grande exposição à combalida economia da Espanha.
Essa não é a primeira tentativa do México de restringir o poder das grandes operadoras. Em 2011, a Suprema Corte mexicana decidiu que a Telcel, outra empresa de Slim, não poderia usar liminares para prorrogar as tentativas dos reguladores de telecomunicações de forçar reduções de tarifas de interconexão. O governo também golpeou a Telcel com uma multa de US$ 1 bilhão por supostamente ter usado altas tarifas de interconexão para prejudicar as concorrentes, mas a empresa conseguiu se livrar da multa negociando um acordo com o governo.
Tarifas menores não afetaram a participação de mercado da Telcel, levando as rivais a pressionar pela adoção de regras assimétricas.
Os reguladores podem acabar tendo que buscar um equilíbrio delicado entre as grandes empresas. Enquanto tentam beneficiar os consumidores, eles talvez temam também sufocar investimentos em infraestrutura, diz o analista do HSBC Richard Dineen.
À medida que a receita com transmissão de dados torna-se mais importante para a América Móvil, o impacto das tarifas de interconexão de chamadas de voz também pode diminuir. Mas a transmissão sem fio de dados representou apenas 20% da receita de serviços no terceiro trimestre.
Com o México representando quase 37% das receitas e cerca de 49% do lucro Lajida em 2011, o futuro próximo da América Móvil dependerá da vontade dos reguladores do país. Baseado no desempenho da empresa no passado, Slim encontrará uma maneira de afastar os maiores receios dos investidores.