A ‘vênus platinada’ ficou para trás e cedeu espaço para uma Globo cheia de cores, variedades e que entende a internet como sua nova aliada.
Com muita sutileza, a Globo transformou sua atuação no mercado de mídia e entretenimento do Brasil.
É uma mudança quase imperceptível, com alarde apenas no mercado corporativo, mas com uma série de fatores por trás. De fato, não é difícil responder o grande porquê da questão.
A tradicional emissora, assim como qualquer empresa, jamais pode ‘parar no tempo’. Especialmente quando atua em um segmento de tamanha “efemeridade” como o mercado de mídia e entretenimento.
Para os que caíram de ‘paraquedas’ na temática, há alguns meses, o grupo Globo anunciou que seria uma ‘media tech’ a partir de então.
Isso significa uma empresa de mídia e tecnologia. Mudança significativa para uma companhia que sempre esteve posicionada como emissora de TV e veículo de comunicação.
Por sinal, a rede social escolhida para o anúncio foi justamente o LinkedIn, conhecido por movimentar networking e estabelecer contatos do mundo corporativo.
É uma escolha estratégica, que mostra como a Globo segue preocupada em anunciar sua transformação do jeito ‘adequado’ e sem grandes eventos.
Para se ter uma ideia, o grupo é o maior conglomerado de mídia e comunicação da América Latina. Em 2020, a emissora conquistou uma nova posição de destaque.
Superou a rede CBS, dos Estados Unidos, e se tornou a segunda maior do mundo. Fica atrás apenas da ABC, de propriedade da Disney. É uma conquista que deixa gigantes como BBC, NBC, Televisa, CNN e outras, para trás.
Mas, com resultados tão gigantescos, por qual motivo a empresa caminhou para o lado da tecnologia? A TV vai acabar? Novelas não fazem mais sucesso? Televisão aberta perdeu o valor?
Mesmo com tantas especulações, principalmente no dito popular, a resposta para todas as perguntas levantadas é negativa.
A mudança envolve uma série de fatores que visam apenas posicionar a emissora a caminho do futuro. É o que vamos entender a seguir.
Uma potência chamada ‘telenovela’
Amem ou odeiem, as novelas brasileiras sempre foram grandes fontes de lucro da Globo.
Mas, quando muitos param e procuram pelo último grande fenômeno da emissora, a trama Avenida Brasil é a primeira que surge em mente.
E vale considerar: em 2022, a novela completa 10 anos de exibição. O que isso significa? Que as produções da emissora não são a mesma potência?
Não necessariamente. Entender os motivos que levam uma produção a ‘parar o país’ ou não envolve criação e outros fatores.
O detalhe aqui é que com ou sem sucesso, a emissora sempre pode conseguir ótimos lucros com a venda de suas produções para o exterior.
Algumas tramas, mesmo sem grande sucesso no país, conquistam até mesmo uma estatueta do Emmy (Oscar da TV), título que facilita a negociação para que a trama seja exibida em outras nações.
Isso sem mencionar a liderança no Ibope, que garante um bom valor para patrocínio e espaço nos intervalos comerciais. Mas, falar de audiência é um fator complexo.
Por que a audiência, com o passar dos anos, só tende a cair?
Antes de mais nada, é importante destacar que o Brasil é o país que melhor se relaciona com as redes de TV.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a final do Campeonato da NFL, o Super Bowl, é o grande momento anual da televisão.
Anunciantes investem milhões em comerciais e a transmissão vira uma festa grandiosa, com repercussão mundial. A audiência do último chegou em 92 milhões de espectadores.
A Globo, para se ter uma ideia, entrou na revista The Economist, em 2014, por alcançar um público de 91 milhões por dia. Feito que a TV americana só alcança uma vez por ano, com o futebol americano.
Mas, obviamente, a audiência só cai com passar do tempo. A novela “Selva de Pedra”, em 1972, chegou a conquistar 100% dos televisores ligados em um determinado capítulo.
Obviamente, tivemos uma mudança na forma como é feito o cálculo de Ibope. Em 2004, “Senhora do Destino” terminou com 50 pontos de média, mas ficaria com 38 pontos pela medição atual.
Porém, mesmo com as novas mecânicas, é viável dizer que as pessoas assistem menos televisão, de acordo com o Kantar Ibope.
Há um sutil crescimento nos números de TVs ligadas em 2021, cerca de 2%, mas também uma queda de audiência anual para todas as emissoras. O que isso significa?
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A internet é a grande vilã?
De fato, a universalização da internet, especialmente a maior adesão às conexões de banda larga, gerou impacto no negócio televisivo.
Quem não abraçar o mundo virtual e vê-lo como um aliado certamente ficará para trás. Porém, a queda de um não significa necessariamente a ascensão do outro. Ao menos no atual cenário.
O número de TVs ligadas é crescente, mas elas podem estar ligadas tanto para streaming, quanto para jogos, vídeos caseiros, mídias físicas, YouTube e outras atividades.
O que não se deve ignorar, de fato, é que a internet não pode ser vista como a grande antagonista, sim como aliada.
A audiência deixou de ser o principal fator que faz um programa ser considerado um sucesso.
O reality Masterchef, na versão brasileira exibida pela Band, se tornou o ‘queridinho’ das redes sociais. O programa dominou os assuntos mais comentados da internet centenas de vezes, mesmo quando não conquistava grandes números no Ibope.
Tal fato fez com que grandes marcas procurassem o show, que era fortemente engajado na internet. Ações publicitárias foram realizadas em conjunto com a web.
As empresas mostraram que estavam mais interessada no programa que todos estavam comentando, do que no campeão de audiência que passava despercebido pela internet.
Os tão falados ‘novos hábitos’
Outro fator que jamais poderá ser ignorado são os tão mencionados ‘novos hábitos’ de consumo. Conquista que deve ser atribuída à Netflix e toda a explosão que foi o seu modelo de negócio mundo afora.
Hoje, as pessoas entendem o quanto é significativo ‘escolher’ o que quer assistir e as TVs se curvam ao formato.
Mesmo com programação linear, todas encomendaram seus próprios aplicativos de vídeo sob demanda. Com a Globo não foi diferente, surgiu o Globoplay, que caminha para se tornar o maior streaming de conteúdos brasileiros.
Entretanto, com ou sem um novo hábito, ou baixa de audiência, a TV não perdeu seu reinado e muito provavelmente ganhou uma aliada: a internet.
É difícil não a enxergar como uma grande pedra no caminho, mas um conteúdo relevante exibido na TV ainda tem protagonismo entre os assuntos da web.
A maior prova é o sucesso do Big Brother Brasil, mais conhecido como BBB21 em sua última edição. A condução do programa foi toda fomentada pela web, que movimentou debates, promoveu favoritos e cobrou posicionamentos.
Por sinal, a campeã da edição se tornou uma grande potência graças aos seus mais de 27 milhões de seguidores no Instagram, com um poder incalculável de influência.
Globoplay e o empurrão do Big Brother Brasil
Já podemos dizer que o reality foi um grande empurrão para o Globoplay, que viu seu total de horas consumidas disparar. Com o sucesso de tráfego, a plataforma já providencia mais de 100 projetos originais.
Se o streaming do grupo começou ‘perdido’, com problemas de otimização, usabilidade e até mesmo inserção nas Smart TVs, o caminho agora parece traçado.
Ao que tudo indica, a empresa entendeu a força do produto brasileiro e da exclusividade que possui sobre ele. Os licenciados (leia-se séries internacionais) estão ali, mas aparentemente deixaram de ser carro-chefe.
Obviamente, a Globo é um conglomerado que envolve vários tipos de negócios: canais fechados, streaming, portal de notícias, entretenimento, entre outros. Mas, o que imprime a nova identidade é a compreensão de que a internet é vital para a continuidade e sucesso do negócio.
No caminho dos gigantes ou no mesmo modelo que eles?
Quem acompanha ao menos uma prévia do mercado entende que um aprende com o outro.
A Netflix, por exemplo, quer ter a mesma força da TV Globo em seu conteúdo nacional, assim como a Globo quer ter a mesma flexibilidade e tecnologia da gigante concorrente.
Portanto, dizer que o streaming matou ou vai acabar com a TV é uma definição superficial, para um debate que pode ser um tanto quanto complexo.
A jovialidade também é uma característica na qual o streaming se apropria, mas o sucesso dos ‘realities shows’ prova que o público jovem não abandonou a programação linear.
Se o Globoplay surgiu sem ter muito diálogo com a TV Globo, o cenário é outro. Principalmente após o sucesso das novelas antigas no catálogo, assim como a entrada dos canais ao vivo.
A conclusão é que se a Globo caminha para ser uma empresa de tecnologia e conteúdo, significa que a emissora ainda se baseia na força de sua programação, mas entende que precisa se fazer presente nos novos hábitos e formatos de consumo.
Com informações de Memória Globo, Observatório da TV, DM, EXAME, Agência Brasil, VEJA, Notícias da TV e Folha de PE.