Especialistas em genética estão colaborando com autoridades policiais para criar retratos falados de indivíduos mesmo sem testemunhas oculares. Em vez disso, eles utilizam o material genético do suspeito, como encontrado em vestimentas, cabelos e outras secreções corporais, para determinar sua aparência física. Todo esse processo é facilitado com o auxílio da inteligência artificial.
A empresa norte-americana Parabon Nanolabs, financiada pela Casa Branca, já está empregando essa técnica para resolver crimes em diversos países. No entanto, essa abordagem tem gerado controvérsias. Em um dos casos, um retrato falado indicava um indivíduo jovem, mas o criminoso verdadeiro era um idoso. Em outro exemplo, um retrato falado de um homem negro foi considerado racista após ser divulgado pela polícia e exibido na televisão.
No Brasil, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e a Polícia Federal (PF) estão trabalhando em conjunto desde janeiro deste ano em um projeto que utiliza a inteligência artificial para criar imagens de suspeitos a partir de amostras de DNA.
Esse projeto tecnológico surgiu há alguns anos. Em 2015 começou esse trabalho, fruto da parceria entre PUC-RS e PF.
Entenda melhor
A líder do projeto é a geneticista Clarice Alho. Ela explicou a Tilt que a motivação para o projeto surgiu devido à inadequação dos bancos de dados internacionais em relação às características genéticas do Brasil, que é marcado pela miscigenação. Clarice menciona que até mesmo ela possui DNA mitocondrial indígena, o que ressalta a importância de considerar a diversidade genética da população brasileira.
O objetivo do projeto é criar uma base de dados genéticos com informações de mil voluntários. Nesse momento, já foram reunidos mais de 500 voluntários, sendo todos inicialmente do estado do Rio Grande do Sul. A iniciativa visa ampliar o conhecimento sobre a diversidade genética presente no país, possibilitando estudos mais abrangentes e precisos sobre a população brasileira.
O modelo de inteligência artificial está atualmente em uma fase avançada, onde a coleta e o armazenamento de DNAs em construção foram concluídos. Entretanto, o próximo passo necessário é a execução completa do modelo. Ao ser questionada pela reportagem, a Polícia Federal (PF) não respondeu ao pedido de entrevista, provavelmente em relação a esse assunto.
A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) emitiu uma nota à reportagem para esclarecer que, de acordo com um princípio fundamental, eles não utilizam o DNA para determinar características fenotípicas, como a cor da pele, dos olhos, cabelo e traços faciais. Em vez disso, a APCF enfatiza que o uso do DNA é restrito a fins criminais e raramente é empregado para a definição de características externas.
Leia a nota da APCF:
A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) esclarece que o uso do DNA como ferramenta forense, por princípio fundamental, não pode ter características fenotípicas, ou seja, definir cor da pele, dos olhos, cabelo, traços do rosto, entre outras. Por lei, o DNA forense deve ser apenas para fins criminais, com raras exceções de uso para definição de características externas, como restos mortais ou pessoas desaparecidas. Cabe esclarecer, ainda, que o projeto citado na reportagem está em desacordo com a legislação pátria e desrespeita princípios fundamentais de direitos humanos, além disso, não tem relação com a perícia criminal da Polícia Federal, única categoria da instituição responsável pela análise forense de perfis genéticos.
A tecnologia só está em testes
Clarice Alho, explicou também que a PF não está fazendo [retratos falados por DNA] ainda porque não tem uma legislação de suporte. Não está sendo feito por questões éticas, legais, morais.
Por enquanto, estão sendo feitos testes, para que no futuro, essa máquina possa ser uma forma de ajuda.