Nos últimos anos, uma prática que já era conhecida em áreas controladas por facções criminosas, como favelas e zonas periféricas do Rio de Janeiro, começou a se expandir para bairros formais da cidade, causando grande prejuízo aos moradores e à infraestrutura urbana. Milicianos estão cortando cabos de telefonia e internet para obrigar a população a contratar serviços clandestinos de internet, operados pelo próprio crime organizado. O esquema tem se tornado uma das principais formas de controle social e financeiro em regiões como Guadalupe e Olaria, afetando milhares de pessoas.
Segundo as denúncias, os criminosos danificam deliberadamente os cabos de telecomunicações de grandes operadoras e, no lugar, instalam suas próprias redes de internet clandestina, conectadas a centrais controladas por facções ou grupos milicianos. Este tipo de ação impede que as operadoras legítimas possam fornecer serviços de internet ou telefonia, deixando os moradores sem escolha a não ser recorrer aos criminosos para se reconectar. A instalação do serviço clandestino geralmente custa cerca de R$ 100, além de uma mensalidade de R$ 120.
Expansão para bairros formais e aumento das ameaças
Se antes a prática era restrita a áreas sob forte influência do tráfico, como favelas, agora os relatos indicam que bairros considerados formais e de classe média também estão sendo afetados. O morador de uma dessas áreas, que pediu para não ser identificado, relata a pressão sofrida: “Eles cortaram todos os cabos da minha rua e apareceram cobrando R$ 100 para instalar um serviço que ninguém sabe de onde vem. Preferi gastar mais e contratar uma internet via satélite, mas nem todos aqui têm essa opção.”
O crescimento dessa prática tem gerado um alerta sobre a deterioração da segurança pública no Rio de Janeiro. Em várias regiões, as operadoras de telefonia têm recusado enviar técnicos para reparos, alegando ameaças físicas e falta de segurança. Ao ligar para o atendimento, os moradores ouvem mensagens automáticas avisando que as equipes estão impossibilitadas de entrar na região devido às condições perigosas.
Lavagem de dinheiro e controle social
A polícia investiga se essa expansão dos serviços clandestinos de internet faz parte de uma estratégia maior de lavagem de dinheiro das facções criminosas e milícias. Com o controle de redes de internet e telefonia, os grupos conseguem não apenas lucrar com a prestação ilegal de serviços, mas também fortalecer sua influência sobre os moradores. A prática de instalar centrais clandestinas é vista como um novo braço da economia do crime, complementando atividades como extorsão e venda de serviços de “segurança”.
De acordo com dados do setor, mais de 7 milhões de consumidores em todo o Brasil foram afetados por esse tipo de interferência criminosa no último ano, com o Rio de Janeiro sendo uma das cidades mais impactadas.
Alternativas: internet via satélite
Com a imposição da internet clandestina, alguns moradores começaram a buscar soluções alternativas. O serviço de banda larga via satélite da empresa Starlink, de Elon Musk, tem sido uma das opções mais procuradas por quem deseja escapar da influência do crime. A tecnologia, antes usada apenas em áreas rurais ou de difícil acesso, está ganhando espaço em zonas urbanas controladas pelo crime.
“Estou gastando mais de mil reais para instalar a antena e, ainda assim, pago R$ 180 de mensalidade. Mas prefiro isso a ficar refém dos bandidos”, diz um morador de Olaria, que viu sua rua ser dominada pela milícia. Em algumas áreas, o uso da Starlink já é notável, com o Rio de Janeiro se tornando a terceira cidade no Brasil com mais usuários do serviço, atrás apenas de Boa Vista e Manaus.
O futuro da conectividade no Rio
Enquanto a polícia e as operadoras de telecomunicações tentam encontrar soluções para combater essa forma de dominação territorial, os moradores do Rio de Janeiro seguem sem respostas claras. A falta de ação efetiva e de segurança pública agrava a situação, deixando a população à mercê do crime. Enquanto isso, o acesso à internet, algo essencial para o trabalho, estudo e comunicação, se torna mais um ponto de disputa em uma cidade cada vez mais fragmentada pela violência.
Essa nova estratégia criminosa não só reflete a força do crime organizado, mas também expõe a vulnerabilidade das instituições públicas em garantir serviços básicos à população. A investigação das autoridades sobre o envolvimento dos milicianos nesse esquema de lavagem de dinheiro será crucial para tentar frear o avanço dessa prática que ameaça a segurança e a economia digital do Rio de Janeiro.
* Sugestão de vídeo relacionado ao assunto: