O Ministério das Comunicações (MCom), sem realizar um processo licitatório, fechou um contrato no valor de R$ 15,75 milhões com uma empresa de um servidor do Ministério da Fazenda, com o objetivo de realizar a capacitação de crianças e adolescentes de baixa renda em novas tecnologias.
O valor destinado a empresa foi empenhado (reservado para pagar) no começo de dezembro e será liquidado antecipadamente em uma única parcela, algo incomum na administração pública. A contratada em questão é a Rede Brasileira de Certificações, Pesquisas e Inovação (RBCIP), uma organização sem fins lucrativos. A empresa fundada em 2019 está sediada em Brasília e tem como diretor-presidente e associado o auditor do Ministério da Fazenda, Marcelo Fiche.
A RBCIP foi indicada pelo senador Izalci Lucas (PSDB-DF) em ofício enviado para ministro das Comunicações, Juscelino Filho, sob o argumento de que a contratada tem “demonstrado notória capacidade na execução de programas de apoio à inovação”.
Esse processo de contração sem chamamento público e por indicação é possível por causa da Lei nº 13.204, sancionada em 2015, que permite o uso de emendas parlamentares para entidades do terceiro setor, caso da RBCIP, sem qualquer processo seletivo.
Embora a indicação tenha sido realizada em março, a confecção do contrato só foi andar com celeridade a partir de outubro. O aval para a confecção do contrato sem licitação e com pagamento em parcela única adiantada foi anunciada no dia 24 de outubro, após reunião do Marcelo Fiche e outros representantes da RBCIP com o com o ministro Juscelino Filho na sede do ministério, em Brasília. Outros chefes do órgão participaram do encontro.
O que chama atenção para esse caso é o pagamento adiantado do contrato, cuja prática com dinheiro público não é permitido pela legislação brasileira. Entretanto, o pagamento foi autorizado após uma portaria conjunta dos ministérios da Fazenda, Gestão e Inovação, e da Controladoria-Geral da União, de agosto de 2023, justificando a antecipação para “fornecimento de equipamentos e materiais especiais de fabricação específica”.
De acordo com reportagem do Metrópolis, todas as informações podem ser conferidas em documentos públicos do Sistema Eletrônico de Informações (SEI) do Ministério das Comunicações, processos judiciais, consulta da Receita Federal e Sistema Eletrônico de Agendas do Poder Executivo Federal (e-Agendas).
Posicionamentos da empresa e do MCom
O empresário Marcelo Fiche disse que a RBCIP tem experiência comprovada na área de ensino de tecnologia itinerante em escolas públicas e que apresentou o projeto para diferentes políticos, até conseguir a emenda da Comissão Senado do Futuro. A previsão do projeto, que custa R$ 15,75 milhões, é atender 15 mil alunos até 2026 nos estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Roraima e do Maranhão.
“Eu não vou dizer que nós somos os únicos que podem fazer um projeto itinerante nas escolas públicas, mas eu digo que sou o único no Brasil que fez um projeto avaliado e que sabe como gerenciar. Toda essa parte de gestão é quase uma exclusividade nossa. Chamamento é quando vai pegar pessoas que talvez nunca fizeram um projeto desses”, avaliou o empresário, que tem doutorado em economia. Ele destacou que a empresa também participa de processos seletivos pelo país.
Já o MCom, em nota, disse que não é responsável pela indicação da empresa, e que respeitou todos os parâmetros legais para a contratação.
“Merece destacar que o MCom respeitou todos os parâmetros legais ao longo da análise das fases processuais permitindo firmar o Termo em questão, em conformidade com os preceitos fundamentais da administração pública federal”, escreveu em trecho da nota.