21/11/2024

Teles americanas começam a testar um ‘mundo sem linhas fixas’

Objetivo da AT&T e Verizon é eliminar as velhas redes para sempre. Nos EUA, cerca de 40% dos domicílios já não possuem telefone fixo.
Moradores e empresas de Carbon Hill, no Estado americano do Alabama, foram surpreendidos por uma carta da companhia telefônica AT&T em fevereiro. A companhia informava que o município, que se apresenta aos visitantes como “a cidade com futuro”, poderia participar de uma das maiores mudanças tecnológicas desde a invenção do telefone por Alexander Graham Bell.

Se os reguladores aprovarem, os clientes de telefonia fixa da AT&T terão de migrar para o serviço sem fio ou de alta velocidade. Novos clientes não serão autorizados a contratar o serviço tradicional de telefonia fixa, via cabo. O principal executivo da AT&T no Alabama, Fred McCallum, escreveu que as mudanças propostas são uma “oportunidade excitante para os nossos consumidores e para a nossa empresa”.

Mas Janice Pendley, funcionária da prefeitura de Carbon Hill, diz que alguns moradores estão apreensivos. “Alguns deles gostam do telefone fixo, e gostam dele do jeito que é hoje”, diz.

Nos últimos dez anos, a AT&T e sua concorrente Verizon Communications instalaram cabos de fibra óptica e modernizaram suas antenas com o objetivo de substituir as centenárias redes de telefone por tecnologia desenvolvida para a era da internet. As melhorias resultantes na velocidade da internet e da cobertura sem fio têm incentivado o uso de telefones celulares e alimentado a popularidade dos serviços de “streaming” de vídeo e de chamadas de voz com base na web, como o Skype.

Quase 40% dos lares americanos hoje não têm telefones fixos e há no país mais telefones celulares do que habitantes. “A revolução está ao nosso redor”, diz Thomas E. Wheeler, presidente do conselho da Comissão Federal de Comunicações, ou FCC, na sigla em inglês. Uma rede toda baseada em internet pode levar a produtos melhores, preços menores e “enormes benefícios” para os consumidores, segundo ele.

Como a nova tecnologia também é bem menos regulada, a mudança preocupa rivais menores, como a EarthLink Holdings  e a TW Telecom que vendem serviços a clientes na “última milha” (a parte da rede que se conecta ao usuário final) dos fios de cobre instalados pela AT&T ou Verizon, cujas tarifas são reguladas. Eles temem que a alteração elimine esse acesso.

A operadora de celular Sprint Corp por exemplo, teme que a AT&T possa cobrar caro demais quando seus clientes tentarem ligar para os usuários da AT&T.

“Essa gente acredita que, ao mudar equipamentos na rede, podem jogar todas as regras no lixo”, diz Chris Murray, da área de assuntos governamentais da EarthLink, que tem sede em Atlanta.

A AT&T e a Verizon afirmam que os concorrentes vão continuar tendo acesso a suas redes, apesar de que terão que renegociar os acordos comerciais, em vez de usar preços definidos pelos reguladores. A AT&T afirma que ninguém deixará de usar o modelo tradicional de telefonia fixa até que a operadora possa oferecer a esses clientes “uma alternativa”.

A revolução está prestes a receber um empurrão do governo americano. Em janeiro, a FCC decidiu permitir que as operadoras iniciassem “experimentos” que liberem as pessoas das velhas redes telefônicas. Em resposta, a AT&T está buscando autorização para lançar uma série de mudanças que poderiam começar com não permitir que novos clientes em Carbon Hill e em uma parte de Delray Beach, na Flórida, contratem o serviço de telefonia fixa tradicional baseado em cabos.

A AT&T quer que os clientes novos e os atuais acabem usando serviços de banda larga, telefones celulares ou convencionais que se conectam a uma caixa semelhante a um roteador. Conectada a uma tomada, essa caixa envia sinais para uma torre de celular.

A aprovação do primeiro passo dos planos da AT&T pode ocorrer já em junho. Toda a alteração nos sistemas de telefonia fixa em Carbon Hill e Delray Beach pode levar anos, com cada etapa sendo submetida a minuciosa análise dos reguladores.

A FCC afirma que não autoriza que as operadoras fujam das suas obrigações de oferecer serviços universais ou acesso fácil ao sistema de comunicação. A agência garante que vai monitorar a reação dos consumidores.

Um sinal verde ao projeto da AT&T encorajaria outras operadoras a tentar obter aprovação para seus próprios experimentos e a própria AT&T a expandir o seu a outras localidades. A Verizon anunciou que pedirá autorização para desativar a sua velha rede, mas não informou quando.

A Verizon gastou mais de US$ 23 bilhões nos últimos dez anos para construir seu serviço baseado em fibra óptica, o FiOS, que hoje tem mais de 6 milhões de clientes residenciais no país. A AT&T planeja converter toda sua rede, presente em 22 Estados americanos, em tecnologia baseada em protocolo de internet até 2020. Ela está investindo US$ 6 bilhões durante três anos para substituir parte da sua rede de cabos de cobre por fibra óptica.

As duas telefônicas, que juntas têm mais de 250 milhões de clientes nos EUA, não têm dúvidas sobre seu objetivo final: desativar as velhas redes para sempre. Elas afirmam que mantê-las em operação custa bilhões de dólares ao ano, mesmo quando muitos clientes deixam de usá-las.

“De certa forma, o que estamos tentando fazer é construir um avião enquanto ele está voando”, diz Larry Irving, um dos líderes do Internet Innovation Alliance, um grupo que promove o setor de banda larga, financiado em parte pela AT&T. Irving prevê que a transição do país para uma rede totalmente baseada no protocolo de internet “será mais difícil” que a migração da TV analógica para a digital.

A AT&T afirma que transição vai criar redes mais rápidas e mais baratas, que vão acelerar a criação de serviços aperfeiçoados de chamadas de voz e vídeo em alta definição. A telefonia com base na comutação de circuitos exige conexões ponto a ponto, separadas, para cada ligação. Como o tráfego nos sistemas baseados no protocolo de internet consiste em pequenos pacotes de dados, a AT&T poderia reduzir o número de locais onde ela libera o tráfego para outras operadoras de milhares para apenas alguns.

As mudanças também podem ajudar as operadoras a escapar da regulação que não se aplica aos concorrentes do setor de TV a cabo, que invadiram o negócio de telefonia há muito tempo.

“Nós não estamos dizendo que estamos migrando para uma zona livre de regulação”, diz Robert Quinn, diretor da AT&T para assuntos regulatórios federais. Segundo ele, o objetivo dos testes para eliminar os telefones fixos tradicionais é determinar quais regulações são necessárias.

Sobre os rivais menores que dependem das redes das grandes operadoras, David Young, diretor de assuntos regulatórios federais da Verizon, diz que eles “tiveram uma década para se preparar para isso”.

No início dos anos 2000, a FCC decidiu abrandar as regras para os serviços de internet de banda larga. A agência, por exemplo, isentou as empresas de regras que exigiam que elas vendessem espaço em suas redes de fibra óptica e baseadas em protocolo de internet para outras empresas a preços regulados. Isso incentivou operadoras como a AT&T e a Verizon a desenvolver conexões de internet mais rápidas.

Operadoras de telefonia e provedores de serviços de internet de menor porte afirmam que não é justo que a AT&T e a Verizon escapem da supervisão dos reguladores porque estão migrando para um tipo diferente de rede. Essas firmas dependem do acesso à infraestrutura das grandes telefônicas para oferecer seus serviços – e temem a ameaça que a desativação da rede tradicional representa. Elas dizem que isso poderia diminuir a concorrência e elevar o custo dos consumidores.

Por anos, as operadoras americanas fecharam acordos de interconexão com base em um conjunto de preços regulados. O governo é autorizado a intervir se não houver acordo nas negociações. Agora, as grandes telefônicas sugerem que as outras operadoras devem fechar acordos de interconexão nas mesas de negociação, como já fazem com o tráfego de dados sem fio.

Com informações de The Wall Street Journal.
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